Em plenário virtual, o STF formou maioria para invalidar dispositivo da reforma trabalhista que exige quórum qualificado (2/6 de seus membros), para aprovar ou revisar súmulas ou enunciados trabalhistas. Até o momento, cinco ministros acompanharam o voto do relator, ministro aposentado Ricardo Lewandowski. Resta votar o ministro André Mendonça.

O julgamento foi retomado na última sexta-feira, 11, e deve ser encerrado no dia 21 de agosto.

O caso

Ajuizada pelo então vice-procurador-Geral da República, Luciano Mariz Maia, a ação questiona dispositivos da reforma trabalhista de 2017 que fixam procedimento e regras para o estabelecimento e a alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência sem força vinculante pelo TST e pelos TRTs.

Segundo Maia, as regras impugnadas, ao exigirem quórum altamente qualificado (2/3 de seus membros) para que os Tribunais do Trabalho aprovem ou revisem súmulas ou enunciados de jurisprudência uniforme, ofendem os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois a CF exige maioria absoluta para que tribunais declarem a inconstitucionalidade de leis ou atos normativos.

Ele observa que a faculdade de elaborar regimentos internos sem interferências dos demais Poderes e “dispondo sobre a competência administrativa e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais” é pressuposto inafastável para a concretização da função atípica inerente à autonomia administrativa dos tribunais e para o próprio exercício independente e imparcial da jurisdição.

Dessa forma, a ADIn pede a declaração de inconstitucionalidade do artigo 702, incisos I, alínea “f”, e parágrafos 3º e 4º da CLT (decreto-lei 5.452/43), com a redação dada pela lei 13.467/17.

“Art. 702 – Ao Tribunal Pleno compete:
I – em única instância:
[…]
f) estabelecer ou alterar súmulas e outros enunciados de jurisprudência uniforme, pelo voto de pelo menos dois terços de seus membros, caso a mesma matéria já tenha sido decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, dois terços das turmas em pelo menos dez sessões diferentes em cada uma delas, podendo, ainda, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial;
[.]
§ 3º As sessões de julgamento sobre estabelecimento ou alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência deverão ser públicas, divulgadas com, no mínimo, trinta dias de antecedência, e deverão possibilitar a sustentação oral pelo Procurador-Geral do Trabalho, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, pelo Advogado-Geral da União e por confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
§ 4º O estabelecimento ou a alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência pelos Tribunais Regionais do Trabalho deverão observar o disposto na alínea f do inciso I e no § 3º deste artigo, com rol equivalente de legitimados para sustentação oral, observada a abrangência de sua circunscrição judiciária.”

Voto condutor

O relator do caso, ministro aposentado Ricardo Lewandowski, entendeu que assiste razão à PGR.

“Com efeito, não tenho maiores dúvidas de que um dispositivo legal que coloque limites ou, por qualquer forma, condicione a atividade interna dos tribunais, na espécie, os integrantes da Justiça do Trabalho, vulnera o princípio da separação dos poderes e a autonomia que a Constituição Federal lhes assegura.”

Segundo o ministro, a independência dos Poderes do Estado traduz-se não apenas no exercício autônomo das respectivas atividades externas, nos limites, é claro, assinalados pelo texto constitucional, como também na faculdade de regrarem os trabalhos de seus membros, por meio de regimentos internos, de modo a conferir-lhes a necessária organicidade.

“A alteração legislativa aqui impugnada, como se vê, ao estabelecer parâmetros exógenos para uma das atividades mais típicas dos tribunais, qual seja, a de unificar as múltiplas decisões que deles promanam, acaba por colocar em xeque a autonomia constitucional que o Texto Magno lhe assegura nesta e em outras matérias.”

Em conclusão, de acordo com Lewandowski, é inconstitucional a iniciativa do Poder Legislativo de cercear os TRTs e o TST no tocante à sua atribuição, derivada da função jurisdicional que lhes é inerente, de estabelecer ou cancelar enunciados sumulares.

Assim sendo, votou pela procedência integral da ação. As ministras Cármen Lúcia, Rosa Weber e os ministros Edson Fachin, Nunes Marques e Alexandre de Moraes acompanharam o relator.

Divergência

Ministro Gilmar Mendes inaugurou a divergência por entender que a alegação de violação da autonomia dos tribunais não comporta solução trivial. “Sob o ângulo dogmático, a questão é complexa e envolve a adequada compreensão do locus da autonomia dos tribunais no ordenamento jurídico brasileiro”, afirmou.

“A Constituição Federal não desenhou de forma explicita em qual ponto se inicia a autonomia dos Tribunais e onde termina o campo aberto à atividade do legislador. Em outras palavras, não é qualquer lei que, ao dispor sobre temas processuais, invadirá o âmbito de organização próprio do Judiciário.”

No mais, Gilmar não verificou desproporcionalidade nos requisitos fixados nos dispositivos questionados.

“Todos são de ordem procedimental e consentâneos com a necessidade de assegurar que os enunciados sumulares conformem jurisprudência estável, íntegra e coerente.”

Com efeito, julgou improcedente o pedido da PGR, assentando a constitucionalidade dos dispositivos questionados. Os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso acompanharam a divergência.

Fonte: Migalhas