O Brasil prevê a possibilidade de adoção de ações afirmativas, tanto pelo poder público quanto pela iniciativa privada, com o propósito de promover condições para a igualdade de oportunidades, inclusão e progresso para pessoas ou grupos sujeitos a formas de intolerância. Tais medidas ou políticas não são consideradas discriminatórias.
Com esse fundamento, a 15ª Vara do Trabalho de Brasília julgou improcedente uma ação civil pública, movida pela Defensoria Pública da União, que contestava um programa de trainee da varejista Magazine Luiza destinado a negros.
No processo, o defensor Jovino Bento Júnior classificava o programa como “marketing de lacração”; dizia que a Magalu violou direitos coletivos; alegava a ocorrência de “racismo reverso”; e solicitava o pagamento de indenização de R$ 10 milhões por danos morais coletivos.
Em 2020, o Ministério Público do Trabalho pediu que a ação fosse extinta. Em resposta, o defensor afirmou que o órgão não se preocuparia com os direitos dos indígenas — grupo que, segundo ele, seria excluído pelo programa.
Mais tarde, a própria DPU defendeu ações afirmativas e a política de cotas. A instituição explicou que, devido ao princípio da independência funcional, Bento Júnior não precisava de autorização hierárquica superior para mover a ação.
Já a Magalu, representada pelo escritório Machado Meyer, indicou que o processo seletivo buscava diminuir diferenças raciais existentes nas posições de liderança da empresa.
Fundamentação
A juíza Laura Ramos Morais ressaltou que “a medida instituída pela ré encontra guarida no ordenamento jurídico pátrio e internacional”.
A magistrada lembrou que o Estatuto da Igualdade Racial prevê a possibilidade de ações afirmativas pela iniciativa privada, para a correção de desigualdades raciais. De acordo com o artigo 39 da norma, o poder público deve promover ações voltadas à igualdade para a população negra nas contratações do setor público, além do “incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas”.
Além disso, o Brasil promulgou, em janeiro deste ano, a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância. Como qualquer convenção internacional sobre direitos humanos aprovada pelo Congresso com o devido quórum, a norma tem status de emenda constitucional.
O decreto em questão diz que as ações afirmativas relacionadas a direitos humanos e liberdades fundamentais “não constituirão discriminação racial, desde que essas medidas não levem à manutenção de direitos separados para grupos diferentes e não se perpetuem uma vez alcançados seus objetivos” .
Para Laura, o processo seletivo da Magalu “não configura qualquer tipo de discriminação na seleção de empregados”. Na verdade, “demonstra iniciativa de inclusão social e promoção da igualdade de oportunidades decorrentes da responsabilidade social do empregador”.
Programa similar
A banca Veirano Advogados recentemente lançou um programa de seleção afirmativa com vagas de estágio exclusivamente para pessoas negras. As oportunidades são oferecidas nos escritórios das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.
O programa é voltado a alunos de graduação de Direito do terceiro ou quarto ano. O estágio semanal é de 30 horas em modelo híbrido. Todo o processo de seleção será feito online. As inscrições podem ser feitas até o próximo dia 21/11.
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Processo 0000790-37.2020.5.10.0015
Fonte: Conjur